O que se espera da viuvez?

O baianíssimo Jorge Amado nos faz passear entre os pensamentos, dos mais saudosos aos mais aperreados, de Dona Flor, a recém viúva do incorrigível boêmio Vadinho em“Dona Flor e seus dois maridos”, um clássico romance da literatura nacional. Nessa história ele desenha a sua segunda personagem feminina marcante, uma senhora mui respeitável de um bairro de trabalhadores de Salvador. O autor nos encaminha por entre as ruas, os cabarés e os salões frequentados tanto pelo defunto da primeira página da obra, quanto pela Flor dona da história. No percurso nós conhecemos o espírito de porco da mãe da viúva, as suas amigas e vizinhas, mas também a libido, os desejos e paixões, comuns e escondidos por todas que “se dão ao respeito”. Jorge Amado com sua escrita que mais parece um samba de gafieira nos fazendo ir e vir nos sentimentos das personas, nas suas aflições e conquistas, vai dando forma as ambiguidades que são tão caras a sociedade brasileira. A história nos coloca de frente com um dilema muito real em diversas situações: o que fazer com nossos defuntos? O novo, que sempre vem, toma o lugar completo do antigo? De quebra ainda conhecemos uma Salvador religiosa e profana, com seus poetas e pintores, músicos e mães de santo. Nas palavras de Jorge Amado podemos quebrar um pouco a quarentena e nos deitar noutras camas e descobrir o tamanho de Deus e o fogo do Diabo. 

Texto: João Victor