Potiguara Mendonça

Apresentação

O grupo familiar Mendonça se constituiu a partir de antecessores indígenas pertencentes às etnias Potiguara e Tapuia. Algumas famílias indígenas, de etnia potiguara, migraram do Brejo de Bananeiras/PB para o Rio Grande do Norte a partir do século XVI. O maior registro de migrações se deu há mais de dois séculos, ocasionadas por situações de crise — epidemias de cólera, secas, expansão colonial, etc — (GUERRA, 2011). Esses indígenas que vieram da Paraíba foram recebidos na comunidade, uma vez que já havia contato entre ambos os povos, unindo-se aos indígenas que habitavam o Amarelão através de casamentos e laços familiares. O Território Mendonça tem 6 aldeias localizadas em dois municípios (João Câmara e Jardim de Angicos) na região do Mato Grande no Rio Grande do Norte. São as aldeias: Amarelão, Serrote de São Bento, Assentamento Marajó, Assentamento Santa Terezinha, Açucena e Cachoeira – Nova Descoberta.

Histórico de ocupação do território Mendonça

A criação do município de João Câmara se deu a partir do processo de construção da linha férrea que passava pela Vila Baixa Verde, nos últimos anos de 1800 e início dos anos de 1900. Os Mendonça do Amarelão tiveram participação ativa, com trabalho braçal, na construção do município de João Câmara, uma vez que suas terras, onde produziam agricultura de subsistência, foram cercadas pelos fazendeiros que migraram para a região, forçando os indígenas a procurar outros meios de sustento. Esse fato também influenciou a organização social da comunidade. Os indígenas, que tinham seus horários e calendários próprios de produção (ligados a sinais da natureza, como por exemplo, as chuvas, os períodos de estiagem, os períodos de colheita e extrativismo), passaram a trabalhar na cidade (portanto, fora de suas comunidades) seguindo o horário e o calendário de quem os contratava. Desde a construção do município de João Câmara, houve um processo de invasão e ocupação do território historicamente ocupado pelos Mendonças, o que, pela falta de terras e de condições para produzir alimentos, fez com que os homens indígenas passassem a sair da comunidade por longos períodos em busca de trabalho nas fazendas de algodão, pecuária, entre outras, em troca de alimentos e/ou pagamentos de valores quase irrisórios. Durante esse processo, houve conflitos entre indígenas e fazendeiros. Segundo os depoimentos de indígenas da comunidade, quando tentavam forçar a entrada no território/roçados, os fazendeiros os ameaçavam de morte.

Após esse processo de construção do município de João Câmara, o povo Mendonça perdeu quase a totalidade de seu território, que foi reduzido à área onde estão localizadas atualmente as residências desse povo, na comunidade Amarelão. A partir daí, as famílias Mendonça começaram a ocupar outras áreas, algumas dentro e outras fora do território indígena.

Amarelão

O nome Amarelão vem de um antigo ritual praticado pelos antepassados que cultuavam o Sol, eles subiam uma serra de madrugada e esperavam o Sol aparecer, então, desciam-na cantando e tocando as maracas (instrumento de música feito com cabaça) e se referiam ao Sol como “o Amarelão”. A maior conexão com os antepassados indígenas está relacionada ao nome Mendonça, nome de uma das lideranças da comunidade nesse período migratório — referência a que a família faz uso para demarcar sua diferenciação perante a sociedade. São conhecidos não como “os índios”, mas como “os Mendonça do Amarelão”. A comunidade indígena Amarelão, de etnia Potiguara, tronco familiar Mendonça, está localizada no Território Indígena Mendonça. O povo Mendonça não se declara indígena ou potiguara, e sim Mendonça. Sempre se reconheceram pelo o etnônimo Mendonça como identidade étnica. A partir da luta política por direitos enquanto povo etnicamente diferenciado, passaram a acionar a etnia potiguara, da qual o povo Mendonça faz parte, em um processo de resgate histórico e cultural.

Serrote de São Bento

A comunidade indígena Serrote de São Bento, localizada a 15 quilômetros da cidade de João Câmara, tem como especificidade étnica o pertencimento ao grupo indígena potiguara. Esse grupo era formado por duas famílias, os Batistas e os Paz. Sendo que os Paz são uma continuidade da família Batista, como nos relata o senhor Manoel Batista, filho de Joana Batista, um dos membros mais velhos da comunidade Serrote de São Bento:

Mãe Salina, Chico Batista, tio Joaquim Batista, Pedro Batista, meu tio Mané Paz, minha tia Maria e Luzia Tomaz, que era mãe de Chico Paz. Os Paz e os Batistas eram só duas famílias que moravam aqui. Era o meu tio Mané Paz com a família dele e o tio dele. (informação verbal)¹

Em seguida, chegaram os Conrado e os Vital, vindos da Serra de Araruna, Agreste Paraibano, durante a segunda metade do século XIX, por volta de 1870. Destas famílias, os Conrado se deslocaram para um local chamado de Oiticica e a família Vital se deslocou para Tubibau, estas duas localidades, escolhidas por essas famílias para viverem, pertenciam à cidade de Baixa Verde (atual João Câmara), e hoje correspondem ao município de Jandaíra.

Há duas versões dos anciões da comunidade para o nome Serrote de São Bento. A primeira versão seria que o nome deu-se por motivo de um dos moradores se chamar Faustino Bento. Segundo a professora Francisca Batista de Melo, de 59 anos, o senhor Faustino morava nas imediações da Pedra do Sino e todos se referiam ao local de sua moradia como Serrote de seu Bento, posteriormente passando a chamar a comunidade de Serrote de São Bento. No entanto, a segunda versão diz:

Havia uma família no serrote que gostava muito de caçar. Um dos membros desta família, certo dia, tinha saído para caçar quando, ao se aproximar de um pequeno serrote, viu vários mocós, se aproximou e atirou, acertando a caça. Como era num serrote, a caça caiu em um lajedo. Ao descer este pequeno lajedo para pegar a caça foi surpreendido por uma serpente que ali estava dormindo. O caçador quando a viu ficou muito nervoso e apressou a sua saída, começou a chamar e clamar por São Bento e foi salvo. Desta história surge o nome Serrote de São Bento. (informação verbal)²

Dona Rosa Batista da Costa, 88 anos, conhecida como Dona Rosa ou Rosa curandeira, que nasceu na comunidade e casou com o seu primo legítimo, o já falecido Sr. Manoel Pedro Barbosa da Costa, relembra os seus antepassados e conta que o Serrote de São Bento nunca foi uma comunidade dividida do Amarelão, o ponto divisório era a “cacimba salgada”, e afirma que todos eram de um mesmo tronco, de uma só família. O que é confirmado pelo Sr. Manoel Batista de Lima, 61 anos de idade, que quando fala sobre a sua árvore genealógica afirma que todos que moravam aqui pertenciam a uma só família, por isso os casamentos se davam entre primos. Conta que a primeira escola do Serrote de São Bento, que por sinal ainda existe, era chamada de “grupo”, e muitos da idade deles estudavam lá com a professora Dona Mariinha, e só depois foram estudar no Amarelão, na Escola Alice Soares. Também relata sobre as dificuldades daquela época, os períodos de seca, as epidemias e como faziam para conseguir sobreviver. O senhor “Beel”, como é conhecido, relembra como as famílias faziam os seus roçados, conta que cada família dividia o local para fazer o seu plantio, e, depois de certo tempo, chegaram os fazendeiros que começaram a cercar as terras daqui. Sem terra para produzir, as famílias indígenas começaram a trabalhar para os fazendeiros, plantando algodão, agave e oferecendo a sua mão de obra nas fazendas Jacinto, Santa Eliza, Baixa do Feijão e na fazenda de Zé Guedes (AVÁ ARANDÚ…, 2017).

Cachoeira – Nova Descoberta

A comunidade Cachoeira, como é chamada pelos indígenas que lá residem, foi criada na década de 1950 e está localizada no município de Jardim de Angicos, divisa com o município de João Câmara. A comunidade faz limite com o Assentamento Santa Terezinha. O município de Jardim de Angicos registrou a comunidade com o nome de Nova Descoberta. Segundo a história oral dos Mendonças, um indígena do Amarelão, trabalhou para um fazendeiro da região por anos. Quando esse fazendeiro resolveu se desfazer da fazenda, como forma de pagamento pelos serviços prestados, doou um pedaço de terra, às margens da linha férrea que liga Macau à Natal, a esse indígena. O mesmo levou sua família, que morava no Setor Familiar Bianos no Amarelão, para morar lá. Ergueram casas de taipa e até hoje ali moram, com seus filhos e netos, que ao longo dos anos foram constituindo suas famílias. Um fato importante é que, anos depois de receber a terra doada pelo patrão, o indígena descobriu que a terra não pertencia à fazenda e sim à União, percebendo que a doação fora um ato de má fé de um homem contra a inocência de um indígena. Toda a comunidade foi criada praticamente em cima da linha férrea que está desativada desde a década de 1990.

Assentamento Marajó

Segundo Almeida (2002), em março de 1990, o MST instalou sua secretaria em Natal, no sindicato dos comerciários. A mudança da secretaria do movimento da cidade de Assu para Natal esteve ligada ao redirecionamento de sua para a região do Mato Grande. Na região de Mato Grande, existe um predomínio de estruturas atrasadas, na qual prevalece uma agricultura temporária e de subsistência, baseada em métodos arcaicos como o uso de enxadas, foices, carrinho-de-mão, ou seja, um trabalho basicamente manual. A pecuária é praticada de forma extensiva, caracterizando-se por apresentar o maior grau de concentração fundiária do estado. Além disso, apresenta uma vasta população de posseiros, favorecendo as práticas de grilagem, em virtude de eles não possuírem a propriedade jurídica da terra. Dessa forma, a primeira ocupação organizada pelo MST na Região do Mato Grande foi na Fazenda Marajó. A fazenda ficava localizada no município de João Câmara, de propriedade de Francisco Caraciole Bezerril e correspondia a uma área de 1562 ha. Esta Fazenda já havia sido vistoriada em março de 1988, pela Delegacia Regional do Ministério da Reforma e Desenvolvimento Agrário (M1RAD).

A Fazenda Marajó, antes mesmo de ser ocupada pelo MST, já havia sido alvo dessas ações outras vezes antes de 1990. Uma delas ocorreu em 1988, por camponeses pobres organizados e dirigidos pelo STR do município de João Câmara. Essas lutas anteriores significaram o início da luta pela desapropriação da Fazenda, bem como o acirramento da luta pela terra, desencadeada pela população pobre do campo. Tais ocupações desembocaram, igualmente, num processo de negociação com o INCRA. Assim, no dia 29 de julho de 1990, aproximadamente 300 famílias, sob a orientação do MST, ocuparam a Fazenda Marajó. Essa ocupação teve um caráter diferente das anteriormente organizadas pelo o Movimento dos Sem Terra em Augusto Severo e Santana do Mato, pois para a ocupação da Fazenda Marajó o MST adotou novas táticas e estratégias. Enquanto que nas ocupações anteriores o MST agia isoladamente, no caso Marajó ocorre justamente o inverso, uma vez que o movimento buscou alianças com outros setores do movimento operário e popular, tornando-se, assim, mais aberto para outros segmentos organizados (ALMEIDA, 2002).

Saíram 10 famílias indígenas do Amarelão para fazer parte do início dessa luta , na esperança de terem terra para produzir. Essas famílias conquistaram o direito à terra e foram assentadas no Assentamento Marajó, onde residem com outras famílias não-indígenas até hoje.

Assentamento Santa Terezinha

No início dos anos de 1990, cresceu o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) na região do Mato Grande, e os Mendonça emergiram nessa luta na tentativa de recuperar seus territórios perdidos para os latifundiários da região. Uniram-se ao MST pela falta da FUNAI no estado. Em 1993, os Mendonça, estrategicamente, montaram acampamento junto às terras de João Rodrigues, no pé do Serrote Grande (Serrote de São Bento) para ter acesso à fazenda Saramandaia, que era uma área reivindicada pelos Mendonça onde estavam localizados os açudes, as áreas de plantio e de colheita de frutas nativas historicamente pertencentes ao seu território e que foram tomados pelos fazendeiros da região.

Participaram ativamente desse processo os indígenas Raimundo Louro, Dona Dadinha, Dona Milosa, Orione, Canindé, Antonio Félix, Nazareno, Dona Francisca Damião, Oliveira, Tadeu, Pequinho, Heleno, Bolacha, Dadau, Chico Raimundo, Chico Caetano, Dona Basta e suas famílias, entre outros, que contaram com o apoio do MST e seus representantes, como Livania, Edson (Som), Aldeci (que também é Mendonça), Plínio, Edimilson, Hélio, Antônio Baixinho e Antônio Careca, entre outros. E, principalmente, a liderança religiosa que mais apoiou os Mendonça nessa retomada: a Irmã Terezinha Tesselles Galles, da Congregação Imaculado Coração de Maria, homenageada com o nome do Assentamento. As primeiras reuniões aconteceram em um umbuzeiro centenário que tinha na fazenda, umbuzeiro este que até hoje faz parte dos pontos de memória do Assentamento. Segundo Dona Dadinha (Matrindade Epifânio Barbosa), o Movimento Sem Terra (MST) foi um grande aliado nessa década:

O movimento nos ensinou que colocasse as crianças na frente dos pais para eles não serem agredidos pelos policiais, a Irmã Terezinha sofreu muitas perseguições, não andava sozinha, sempre acompanhada por alguém, rezava terços nas casas das pessoas, foi Deus quem colocou essa irmã aqui, muitas pessoas sofreram com a polícia, mais no fim tudo deu certo, hoje em dia o Assentamento Santa Terezinha recebe esse nome por causa dela. (informação verbal)³

O Assentamento Santa Terezinha é constituído por 89 famílias assentadas (Cadastradas no INCRA), em uma área total de 2.600 hectares (uma parte dessa área está como Área de Preservação Ambiental — APA —, sob a responsabilidade do IBAMA). Tem cerca de 200 famílias (840 pessoas), que são os filhos dos primeiros assentados, que foram constituindo suas famílias e construindo casas no Assentamento. A organização das casas foge dos padrões de um Assentamento de Reforma Agrária, essa organização diferenciada surgiu com os hábitos das famílias indígenas que moravam no Amarelão e migraram para o assentamento. Quando moravam no Amarelão, eles se organizavam em setores familiares e o local onde viviam recebia o nome da pessoa mais velha da família, e levaram esses hábitos para o local, onde moram até hoje. O marco divisório entre o Assentamento Santa Terezinha e o Amarelão é a linha férrea. Foi a partir da construção da linha férrea em um projeto do Governo para transportar o sal de Macau/RN para Natal/RN, que tem início a construção do município de João Câmara (antiga Vila Baixa Verde) e as invasões ao território historicamente ocupado pelos Mendonça do Amarelão, que habitavam a região há mais de três séculos (AVÁ ARANDÚ…, 2017).

Açucena

A comunidade Açucena foi criada por Mendonças que migraram da comunidade Serrote de São Bento no ano de 2005 devido à falta de terras para produção de alimentos. O indígena Francisco Pedro (Chiquinho) soube de um Programa do Governo para a compra de terras através das reuniões que participava no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de João Câmara. O Programa era o Programa Nacional de Crédito Fundiário (PNCF Social) e tinha que ter o mínimo de 20 famílias organizadas em associação para acionar o crédito. Seu Chiquinho criou uma associação com os 8 filhos e mais alguns amigos não-indígenas de fora da comunidade e juntos compraram a Fazenda Buraco Seco, que fica localizada às margens da BR 304, fazendo divisa com a comunidade Serrote de São Bento. A comunidade passou a se chamar Açucena, e eles moram lá até hoje, já pagaram a terra e receberam os títulos de posse.

Tabela com os dados populacionais do Território Mendonça

Comunidade População
- Nº de famílias Nº de pessoas
Amarelão 340 1.100
Assentamento Santa Terezinha 200 840
Serrote de São Bento 104 360
Açucena 17 69
Assentamento Marajó 29 127
Cachoeira/Nova Descoberta 80 300
Total 734 2.796
Fonte: Autores

Mendonças do Amarelão em Natal

Existe um grupo de indígenas pertencente à família Mendonça, da etnia potiguara, que vivem na Zona Norte de Natal, localizados em diversos bairros da capital potiguar. Atualmente, o Fórum de Lideranças Mendonça reconheceu cerca de 48 famílias indígenas de nosso tronco que residem nos bairros de Nossa Senhora da Apresentação, Cidade Praia e Jardim Progresso.

Articulações no movimento indígena, assistência e políticas públicas

O Território Indígena Mendonça está no movimento indígena do RN desde a criação do movimento, no início dos anos 2000, junto com as comunidades Catu–Canguaretama, Caboclos e Bangue–Assú. Antes de ter um movimento indígena formado e atuante no estado do RN, o Território Mendonça já tinha atuação política na luta por direitos, e essa atuação influenciou as lideranças que, mais tarde, formaram o movimento indígena junto com outras comunidades indígenas do Estado. Antes do movimento indígena, a principal luta do Território Indígena era por acesso à água, seguida de acesso à terra (a exemplo da conquista do Assentamento Santa Terezinha) e melhorias na educação. Ainda na década de 1990, o grupo, extremamente organizado, fundou a Associação Comunitária do Amarelão (ACA), órgão que tem como finalidade representar as famílias Mendonça que residam na comunidade e representá-las na busca pela implementação de políticas públicas e assistenciais perante o Estado e a sociedade civil. A implementação de políticas públicas e assistenciais teve início de forma mais efetiva após a I Audiência pública, realizada em 15 de junho de 2005, na Assembleia Legislativa do Estado do Rio Grande do Norte, um marco histórico e legal para os indígenas do estado e, em especial, para os Mendonça, que desde antes da audiência vinham travando lutas em torno das garantias de direitos previstos na carta Magna de nosso país, a Constituição Federal, e demais dispositivos de leis que asseguram os direitos dos povos originários. Mediante os encaminhamentos retirados ao término da Audiência e daí por diante, os indígenas participaram de várias reuniões, conferências e até mesmo contribuíram para a elaboração do Plano Estadual de Políticas da Igualdade Racial, que registrou as demandas elencadas pelas lideranças. Ainda naquele ano, foi solicitada a instalação de um posto da FUNAI no RN, para atender as necessidades das famílias indígenas do Estado. Além de terem sido realizadas outras solicitações, como, por exemplo, o acesso à saúde diferenciada, educação diferenciada (educação escolar indígena) e o acesso à territorialidade (demarcação das terras). No ano de 2013, a professora, historiadora e antropóloga, Jussara Galhardo Aguirres Guerra, realizou a qualificação territorial da comunidade do Amarelão, solicitada pelo Departamento de Proteção Territorial da FUNAI. Hoje, o território tradicionalmente ocupado aguarda pela demarcação de suas terras, já qualificadas.

Os grupos percorreram longos caminhos até de fato obterem respostas claras e significativas na luta por reconhecimento étnico, pela garantia de seus direitos fundamentais e sobrevivência de seus costumes, hábitos e tradições e pelo direito à vida dessas populações. No ano de 2011, finalmente, a Coordenação Técnica Local (CTL–FUNAI/ Natal) foi criada e implementada, e, desde então, passou a atender as comunidades indígenas do Estado. Em 2013, as lideranças solicitaram à SESAI o acesso à saúde diferenciada, o que só veio anos depois, especificamente em 2015, ainda de forma insuficiente para atender ao número populacional das famílias indígenas do estado.

Ainda no ano de 2015, mais uma vez, os líderes indígenas cobraram do Estado a regularização das Escolas Indígenas do Território Mendonça, o que só foi realizado de forma superficial no ano de 2018, quando, no censo do MEC, constava a regularização de 6 unidades de ensino diferenciado localizadas no Território Mendonça, sendo elas: 3 creches, que atendiam desde o terceiro nível da educação infantil até o quinto nível, 2 escolas, que atendem do 1º ao 5° ano do fundamental I e 1, que atende do 1° ano até o 9° ano do Fundamental II. Porém, as instituições mencionadas, na realidade, pertencem à rede municipal de ensino da cidade de João Câmara, que, por meio da lei orgânica, em seu Art. 132 de 2015, estabelece o ensino da educação escolar indígena de acordo com as Diretrizes Nacionais e demais dispositivos de lei que regem a educação escolar indígena em seus territórios.

Em 2017, ocorreu a primeira formação específica para os professores indígenas do Estado e, dentre os participantes, estavam boa parte dos professores indígenas Mendonça. Foi o curso Saberes Indígenas na Escola, um programa da extinta Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (SECADI/MEC, hoje Secretaria de Modalidades Especializadas de Educação — SEMESP), teve uma carga horária de 200 horas e foi executado pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do RN, no campus Canguaretama. Essa ação foi possível a partir de inúmeras idas das lideranças indígenas ao Ministério da Educação em Brasília.

Em 2018, ocorreu a II etapa da formação Ação Saberes Indígenas na Escola, foram 200 horas de formação em educação escolar indígena, tendo como resultado diversos materiais didáticos, paradidáticos e bilíngues contemplando a realidade local do território e colaborando de forma significativa no processo de ensino e aprendizagem, a partir de um processo interdisciplinar entre o saber tradicional e o científico. Nesse mesmo período, as lideranças indígenas, que, em sua grande maioria, são professores, cobraram da Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (APOINME) que promovesse, junto à FUNAI, audiências públicas nas Câmaras Legislativas dos municípios que tivessem escolas em territórios indígenas, a fim de discutir a legislação e o descaso destes municípios em torno da oferta da educação escolar indígena, bem como reforçar a solicitação de regulamentação das escolas perante o MEC. Para que as escolas que atendem alunos indígenas e estão localizadas nas comunidades/aldeias sejam reconhecidas como escolas indígenas pelo MEC, é necessário que as respectivas Secretarias Municipais de Educação informem no censo escolar que a escola é indígena e insiram os alunos no sistema como “indígenas”.

No período de 05 a 06 de dezembro de 2018, ocorreu a primeira Oficina sobre Formação Intercultural, cuja principal finalidade era a discussão sobre a oferta do curso de licenciatura no nível superior destinado aos professores indígenas. A oficina foi promovida pelo Departamento de Antropologia (PPGAS/UFRN), e pela Secretaria de Educação à Distância, Alfabetização e Inclusão (MEC/SECADI). O objetivo do evento era dialogar com os povos indígenas sobre suas necessidades e demandas de formação no ensino superior e elaborar um projeto de curso específico para os educadores indígenas em licenciatura intercultural, cumprindo as normas e diretrizes do PROLIND (Programa de apoio à Formação Superior e Licenciaturas Indígenas).

Em novembro de 2018, o Estado do Rio Grande do Norte criou, via o decreto n° 28.536, a primeira escola indígena pertencente à rede estadual de educação: a Escola Indígena Professor Francisco Silva do Nascimento, que irá ofertar o ensino Fundamental II e Médio no Território Mendonça em João Câmara. Vale ressaltar que a escola citada acima havia sido solicitada no ano de 2005, quando lideranças locais construíram o projeto da escola, ainda à mão. No ano de 2019, durante a VI Assembleia Indígena do Rio Grande do Norte (AIRN) foi criada a Organização da Juventude Indígena do Território Mendonça (OJITM), que tem como finalidade formar jovens que possam atuar no movimento indígena local, estadual e nacional.

Dentro do movimento indígena, a principal pauta sempre foi demarcação de terras, seguida de acesso à água, educação escolar indígena, saúde indígena, entre outras. As lideranças indígenas do Território Mendonça também ocuparam e ocupam cargos no movimento indígena não só em defesa de suas comunidades e Território, mas em defesa dos direitos das comunidades indígenas de todo o estado do Rio Grande do Norte. As lideranças do Território Mendonça atualmente ocupam cargos na: Coordenação Microrregional da APOINME no RN; Coordenação de Mulheres Indígenas da APOINME no RN; Coordenação de Juventude Indígena da APOINME no RN; Comissão Nacional de Educação Escolar Indígena no Conselho Nacional de Educação; Comissão Nacional de Cultura Indígena; Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional; Comitê Gestor de Educação Escolar; Coordenação da Articulação dos Povos Indígenas do RN. Em âmbito local, também ocupam espaços nos Conselhos Municipais.

Em 23 de outubro de 2016, na sede da Associação Comunitária do Amarelão (ACA), na comunidade Amarelão, foi criado o Fórum de Lideranças Mendonça (FLM). No Regimento Interno do FLM, está registrado que se trata de: “órgão colegiado consultivo e deliberativo restrito às lideranças do povo Mendonça, responsável pela articulação e mobilização das lideranças Mendonça”. A organização se dá através do fortalecimento das associações, conselhos, fóruns e espaços de debate, além da realização de oficinas de formação de novas lideranças voltadas à juventude. Os Mendonça ocupam lugares de destaque nos processos de luta, bem como nas reivindicações de direitos.

A organização se dá através do fortalecimento das associações, conselhos, fóruns e espaços de debate, além da realização de oficinas de formação de novas lideranças que visam formar nossos jovens para atuar junto ao movimento indígena, no combate a retirada de direitos. Os Mendonça ocupam lugares de destaque nos processos de lutas, bem como nas reivindicações de direitos.

Essa visão de ocupação de espaços de representatividade é estimulada há anos em nossas comunidades, principalmente pelos mais velhos, que entendem que não são eternos e precisam fortalecer o espírito de luta nos mais novos. Ressaltamos que a maior parte de nossas lideranças é formada por mulheres, que são essenciais na luta em nossas comunidades.

As 6 comunidades do Território Indígena Mendonça têm associações. Todas têm um calendário fixo de reuniões, em que as reuniões internas das Diretorias geralmente antecedem as reuniões com a comunidade. Nas reuniões das Diretorias, as lideranças definem as pautas junto à comunidade, planejam ações, estratégias de atuação, atividades, a participação do grupo no movimento indígena, em conselhos e em demais espaços. As reuniões com a comunidade têm como objetivo receber as demandas das famílias, informar assuntos que atinjam a comunidade, dar retorno sobre resolução de problemas e sobre a atuação das lideranças como seus representantes nos espaços políticos. Segundo as lideranças, mais de 90% das diretorias das associações são mulheres. Essas associações são a principal representação política das comunidades indígenas do Território. Funcionam também como interlocutoras entre comunidade e agentes externos: órgãos de Estado, Organizações Não Governamentais e movimentos sociais.

A Associação Comunitária Amarelão (ACA) foi fundada em 21 de maio de 1994 pela Irmã Terezinha Tessele Galles da Congregação Imaculado Coração de Maria, do Rio Grande do Sul, e lideranças indígenas moradoras da comunidade Amarelão. Com a criação da ACA e o apoio da Irmã Terezinha, a comunidade iniciou um processo de formação política e fortaleceu a luta por direitos dos povos indígenas no Rio Grande do Norte. O objetivo ou missão da ACA é promover o desenvolvimento socioeconômico da comunidade, através de projetos com foco na promoção humana, social e cultural, a partir de processos participativos e formativos, numa perspectiva emancipadora, representando a comunidade junto aos órgãos públicos e privados no atendimento de suas reivindicações.

O Assentamento Santa Terezinha tem duas associações comunitárias: uma vinculada ao INCRA e a famílias assentadas, e outra vinculada ao movimento indígena local (Associação Comunitária do Povo Indígena Mendonça Potiguara), que tem como principal objetivo a busca por direitos e a implementação de políticas públicas diferenciadas, previstas na Constituição Federal.

A comunidade do Serrote de São Bento possui uma Associação, criada em Fevereiro de 2016, cujo objetivo é representar a comunidade e cobrar o acesso à educação, lazer, etnodesenvolvimento e demais garantias de direitos previstos nos dispositivos legais.

Na comunidade do Assentamento Marajó existem duas associações: uma delas vinculada ao INCRA e famílias assentadas, e outra, criada no dia 01 de fevereiro de 2018 para a representação do movimento indígena local, tem como principal objetivo fortalecer a identidade étnica e reivindicar direitos previstos na carta magna do país.

Na comunidade de Açucena, o processo de criação da Associação foi diferente das demais. As famílias se reuniram com o intuito de fazer uma carta ao banco do Nordeste e conseguir financiamento para a compra da área onde hoje residem. Vale ressaltar que essa associação não é indígena, porém, contribui no processo de articulação e busca dos direitos específicos de nossa população. A Associação Comunitária de Cachoeira, do Povo indígena Mendonça Potiguara, foi fundada em 05 de novembro de 2018.

Abaixo, para facilitar a sistematização das informações em uma tabela, segue uma linha do tempo, sobre a criação das associações:

Tabela com os dados populacionais do Território Mendonça

Associação Sigla Comunidade Data de Fundação
Associação Comunitária Amarelão ACA Amarelão 21 de maio de 1994
Associação e Associação Proativa da comunidade Açucena - Açucena 2005
Associação Comunitária Indígena do Serrote de São Bento ACS Serrote de São Bento 05 de fevereiro de 2015
Associação Comunitária do Assentamento Santa Terezinha - Povo indígena Mendonça Potiguara AST Assentamento Santa Terezinha 09 de setembro de 2016
Associação Indígena de Marajó AIM Assentamento Marajó 07 de fevereiro de 2018
Associação Comunitária de Cachoeira - Povo indígena Mendonça Potiguara - Comunidade Cachoeira 05 de novembro de 2018
Cargo Sigla Associações que têm esse cargo
Coordenação Administrativa (Cargo maior nas associações) CG ACA;
ACS;
AST;
AIM;
Associação Comunitária de Cachoeira – Povo indígena Mendonça Potiguara
Presidente (Cargo maior nas associações) - Associação e Associação Proativa da comunidade Açucena
Secretário/a - ACA;
Associação e Associação Proativa da comunidade Açucena ACS;
AST;
AIM;
Associação Comunitária de Cachoeira – Povo indígena Mendonça Potiguara
Tesoureiro/a - ACA;
ACS;
Associação e Associação Proativa da comunidade Açucena AST;
AIM;
Associação Comunitária de Cachoeira – Povo indígena Mendonça Potiguara
Departamento de Etnodesenvolvimento e Cultura DEC ACA;
ACS;
AST;
AIM;
Associação Comunitária de Cachoeira – Povo indígena Mendonça Potiguara
Departamento de Gênero e Geração DGG ACA;
ACS;
AST;
AIM;
Associação Comunitária de Cachoeira – Povo indígena Mendonça Potiguara
Departamento de Educação e Lazer DEL ACA;
ACS;
AST;
AIM;
Associação Comunitária de Cachoeira – Povo indígena Mendonça Potiguara
Fonte: Autores

Atividades Produtivas

O Território Indígena tem como formas de sustento a criação de pequenos animais como galinha, porco, ovelha, carneiro. O trabalho com a agricultura familiar se dá através da plantação de lavouras de subsistência, como, por exemplo: o cultivo do milho, feijão, mandioca, batata doce e algodão. Também o plantio de frutíferas, como cajueiro, mangueira, pinheira, umbuzeiro, plantas medicinais, entre outros.

Os grupos familiares passam por grandes dificuldades para conseguir água, tendo em vista que o local onde se encontra a comunidade possui um nível de chuva muito baixo. A prática da agricultura é feita nos meses de maior incidência de chuvas, iniciando-se em março — tempo de plantio — e indo até junho. Fora deste período, as chuvas irregulares não são suficientes para a plantação. Diante destas adversidades impostas pelo clima, as famílias que vivem neste local passam por vários desafios em determinados períodos do ano para encontrar água para o consumo, tanto dos membros da família, como para a manutenção das pequenas criações de animais e produção de alimentos que, mediante a falta de terras — uma vez que ainda não obtiveram a demarcação de seu território pela FUNAI — realizam nas áreas a que têm acesso. Quando conseguem colher a produção, os indígenas armazenam parte das sementes crioulas para o plantio no ano seguinte.

Os indígenas também produzem artesanato (extrativismo) confeccionando colares, pulseiras, brincos, filtros-dos-sonhos e maracás, entre outros, com cabaças, cipó e sementes (nativas e não nativas). A atividade é desenvolvida visando a preservação, a valorização e o reconhecimento da cultura indígena local. Mas o beneficiamento da castanha do caju é a principal fonte de renda do Território.

A atividade econômica de beneficiamento da castanha do caju no Território Mendonça se iniciou na década de 1980, quando o grupo não trabalhava mais com o algodão nas fazendas, visto que, após seu período áureo, as décadas seguintes marcariam definitivamente uma queda na produção desse produto devido a pragas nas plantações. Segundo afirma o Sr. Francisco Epifânio, conhecido por Chiquinho — um dos primeiros Mendonça a introduzir a atividade com a castanha no Amarelão —, as famílias Mendonça, enxergaram no beneficiamento da castanha uma alternativa “sólida” de geração de renda. Nas comunidades são encontradas várias realidades, desde a família que compra direto do produtor, beneficia e comercializa de forma autônoma, até a família que depende exclusivamente do atravessador, sendo este a figura central em todo o processo de negociação da castanha na comunidade. Os atravessadores do Território Mendonça compram a matéria prima, a castanha do caju, e repassam às famílias da comunidade. Este repasse é feito na base da confiança, já que as famílias não dispõem de capital de giro. Diante de tal situação, elas não têm outra opção senão recorrer a um atravessador para essa aquisição. A negociação com o atravessador é simples: a família compra fiado a castanha do atravessador, com a condição de pagá-lo não em dinheiro, mas em castanha beneficiada ou assada, como é chamada nas comunidades.

Selecionando a castanha

Após a aquisição da matéria prima, a castanha é selecionada por tamanho, normalmente dividida em grande, média, pequena e chocha ou borreia. A castanha chocha são as castanhas que não têm amêndoa, portanto não têm tanto valor. Essa etapa normalmente é realizada na própria casa das famílias e algumas vezes é dispensável de acordo com a uniformidade das castanhas.

Torragem

O terceiro passo é a torragem, que é feita em um caco construído pelas próprias famílias da comunidade a partir da reutilização de um tambor de alumínio ou ferro rolado ao meio e aberto com pequenos furos para que a castanha, ao ser aquecida pelo fogo, libere o óleo LCC (líquido da castanha do caju), este que, por ser inflamável, passa a alimentar o fogo fora e dentro do caco, torrando a castanha. Para garantir a uniformidade das castanhas no caco, ou seja, para que todas as castanhas assem por igual, o torrador faz uso de uma vara, mexendo constantemente as castanhas no caco. Essa vara tem de 1,6 a 1,8m de comprimento. Antigamente, essa ferramenta era feita só com madeira tirada da mata. Hoje, ela é fabricada com um cano de ferro inoxidável e um pedaço de madeira. O pedaço com o ferro fica em contato com o fogo, e o pedaço de madeira, na mão do torrador. Também é usado um vergalhão de ferro, com a finalidade de aumentar a área de contato com o fundo do caco.

Quebra

Essa etapa do processo de beneficiamento consiste na separação da amêndoa da castanha de sua casca. A quebra da castanha é realizada em uma mesa de cimento, com o auxílio de um pequeno cassetete de madeira ou um pedaço de cano de ferro. Todo esse processo é realizado após a fase de seleção, desenvolvida em uma barraca. A barraca, como é chamada nas comunidades, é uma estrutura física usada para proteger os torradores de castanha da chuva e do sol. É uma estrutura relativamente simples, algumas são construídas com madeira serrada, outras com madeira roliça retirada da mata, e a maioria das barracas hoje tem luz elétrica para o trabalho noturno. Nos assentamentos Santa Terezinha, Serrote de São Bento e no Amarelão, as barracas eram construídas nos quintais das casas, pelo fato de as mulheres conciliarem o trabalho com a castanha com os cuidados com os filhos e os afazeres domésticos, mas isso trouxe problemas com a fumaça da castanha, prejudicando a saúde das crianças. Em 2014, as barracas foram reorganizadas lado a lado em uma área coletiva afastada das casas. Hoje há 3 áreas coletivas onde as famílias beneficiam a castanha do caju.

Despeliculagem

Após selecionar, torrar e quebrar, a castanha vai para a fase de despela, onde é retirada sua segunda casca, também chamada de pele. Essa etapa é desenvolvida pela maioria das famílias em suas residências.

O lucro ou saldo da família é obtido do produto da multiplicação da quantidade de castanha assada por seu preço por quilo, subtraído pelo produto da multiplicação da castanha in natura pelo valor por quilo a ser pago ao atravessador, acertado previamente. Por exemplo: uma família pega com o atravessador 50 kg de castanha in natura, e o preço acertado entre a família e o atravessador é R$ 5,20/kg. Cada 5 kg de castanha in natura beneficiada rende 1 kg de amêndoa ou castanha assada. O atravessador receberá a castanha beneficiada a R$28/kg, mais a castanha chocha a um valor de R$1,50/kg. Ou seja, a equação é: [(10×28) - (50×5,20)] + (5x1,5) = 27,5. A subtração do produto das duas multiplicações em colchetes equivale ao lucro da família. No exemplo acima, esta família teria o saldo de R$20,00. Uma vez que os preços praticados pelos atravessadores são proporcionais, se o preço pago pela castanha in natura aumentar também aumentará o preço pago no kg da castanha assada ou beneficiada.

Portanto, um dos problemas enfrentados é a qualidade da matéria prima, já que os cálculos feitos têm como base ou como dado principal a proporção de 5/1, em que a cada 5 kg de castanha in natura beneficiada, é retirado apenas 1 kg de amêndoa. Contudo, quando isso muda, por exemplo, se a saca de 50 kg de castanha in natura render apenas 9 kg ao invés de 10 kg de castanha assada, o saldo da família será negativo, ou seja, a família não teria nem um lucro e ainda ficaria devendo ao atravessador. Um dos períodos melhores para as famílias é a safra, que se inicia na região em outubro e vai até meados de janeiro, sendo este um momento de comemoração, pois o preço pago no quilo da castanha in natura cai em consequência da demanda e as famílias que dispõem de recursos podem adquirir a matéria-prima direto com os produtores, e, com isso, vender a quem quiserem no tempo que acharem mais apropriado. O beneficiamento da castanha do caju é a principal fonte de renda das comunidades Mendonça. Essa atividade ganhou uma importância muito grande e vem sendo passada de geração em geração, sendo assim, podemos afirmar que se trata de uma prática cultural do grupo Mendonça (AVÁ ARANDÚ…, 2017).

Trilha, Festas Tradicionais, Romaria e Toré

Festas tradicionais

Até a década de 90 e início do século 21, era muito comum grandes festas de casamento que duravam até três dias com comidas, bebidas e sanfoneiros. Segundo relato da Sra. Luiza Ferreira de Melo, mais conhecida como Luizinha, essas festas duravam três dias, começando na sexta-feira com a despedida de solteiro dos noivos, que acontecia com todos juntos. Era contratado um sanfoneiro que tocava na sexta-feira até a meia noite, e no sábado cedinho já começava a tocar até a saída dos noivos para a igreja. Eles tinham que dançar a saideira, e, quando chegavam, antes do almoço dançavam a chegada dos noivos, que era para dar sorte. Depois, só ao anoitecer do sábado até o sol raiar no domingo, tinha a história de pegar o sol com a mão. No domingo à tarde ainda dançavam a saída da noiva para sua nova casa. Os preparativos começavam uma semana antes: era feita uma latada (uma espécie de cercado com palha de coqueiros). O piso era de barro batido e precisava ser molhado para baixar a poeira do salão durante os intervalos da festa dados para o sanfoneiro descansar. Eram servidos no almoço do sábado e durante a festa: peru, galinha, porco, bode e boi. O Sr. Francisco Pereira, mais conhecido pelo apelido de Rolinha, Mendonça e agricultor aposentado, também nos relatou um pouco de como eram as festas de Sábado de Aleluia e as comemorações de São João.

Festa da castanha

A Festa da Castanha é uma atividade cultural promovida anualmente pela comunidade indígena Amarelão, com o apoio de parceiros. A festa tem como objetivo dar visibilidade e valorizar o trabalho desenvolvido na comunidade. Ela busca possibilitar o escoamento dos produtos locais, bem como divulgar a nossa cultura indígena e promover atividades culturais, a troca de experiências com outras comunidades indígenas e agricultores familiares da região. Essa Festa começou a ser realizada na década de 1990 pelo primeiro presidente da Associação Comunitária do Amarelão (ACA), Francisco do Nascimento Silva, vulgo Titinho, e era uma atividade de lazer e diversão para a comunidade. Em 2001, essa liderança foi assassinada e então a Festa deixou de acontecer porque não existia mais quem retomasse a organização da mesma. Em 2012, a atual Coordenação da ACA, junto com a comunidade, decidiu retomar a realização da Festa, ficando acordado que esta acontecerá anualmente, sempre no último sábado de agosto.

Crenças e mitos das comunidades

Os Mendonça apresentam diversos mitos na sua cultura, como os relacionados à alimentação, à prática da caça e alguns relacionados à saúde.

(1) O lobisomem do Amarelão

Conta-se no Amarelão que um certo homem “virava lobisomem”. Em uma noite de lua, um velho caminhava pela mata quando viu o monstro. Ele se defendeu, furando-lhe com uma faca no peito, depois, esperou que o sangue jorrasse, enquanto o encanto se desfazia. Assim, descobriu quem era, de fato, o lobisomem que, por sua vez, ameaçou seu adversário de morte, caso ele contasse aos outros aquilo que vira. O homem não se intimidou e afirmou que iria contar a todos sobre o que testemunhara. E assim, o encanto se quebrou e o homem não se transformou mais em lobisomem.

(2) A briga do “rabo de porco”

Conta-se no Amarelão que, há mais de cinquenta anos, no Alto dos Eleodórios, os Mendonça resolveram romper aleluia assando um porco na brasa para que todos dele se servissem. Estavam bem animados até que um imprevisto aconteceu: um desentendimento começou por causa de um irmão ciumento que ordenou à sua irmã, que estava acompanhada do namorado, para que entrasse em casa, caso contrário ele cortaria suas orelhas. O namorado aborreceu-se com o que ouvira e resolveu defender a namorada, enfrentando o irmão dela, dando início a uma tremenda briga. E aí começou toda a confusão, pois como os Mendonça são muito unidos, cada um que estava na festa resolveu defender o parente, o que deu origem a um verdadeiro campo de batalha.

(3) A Fulozinha

A Fulozinha dá pisa nos cachorros de noite com os cabelos, ela tem os cabelos longos arrastando no chão. Para ela deixar caçar os animais é preciso fazer uma oferenda de fumo para ela. Aí ela deixa o caçador fazer sua caçada.4

(4) A lenda do “Buraco Seco”

Havia antes um antigo olho d’água que jorrava, no qual todos iam se fartar. O lugar era numa fazenda distante, há alguns quilômetros do Amarelão. O dono do lugar, então, resolveu não permitir mais “a farra da água” e proibiu as pessoas de irem até lá, foi quando mataram um porco (talvez os restos mortais da “briga do rabo do porco”?) e meteram sua cabeça dentro do olho d’água. Dessa forma, a água cessou de jorrar e o lugar secou. Daí o nome “Buraco Seco”.

Religiosidade

A religiosidade dos Mendonça é muito forte. Logo após o nascimento da criança, antes de procurar o posto de saúde para vacinar, busca-se uma curandeira para curar de mau olhado, sendo também essa prática usada para tratar diversas doenças antes de procurar um médico. A maioria das famílias só vão à farmácia ou procuram hospitais ou postos de saúde em último recurso. Todos os anos, os Mendonça participam de muitas romarias. No mês de maio, o grupo faz duas romarias: uma para visitar a terra de Frei Damião, na cidade de Recife, em Pernambuco; e a segunda para visitar a estátua de Santa Rita, localizada no município de Santa Cruz, no estado do Rio Grande do Norte. Entre o final de Outubro e o início de novembro, os Mendonça também visitam a estátua do Padre Cícero, na cidade de Juazeiro do Norte, no estado do Ceará, encerrando o calendário com a romaria do Bom Jesus dos Navegantes, no município de Touros, estado do Rio Grande do Norte, ao fim de dezembro. A maioria dos Mendonça procura pagar promessas aos santos, mas nem todos que participam destas excursões religiosas são romeiros, tendo em vista que alguns Mendonça fazem da romaria apenas uma viagem turística. Considerando a religiosidade e devoção desse povo, será apresentado a seguir o Calendário Religioso com as atividades em que os Mendonça fazem questão de estar presentes:

Calendário religioso do grupo familiar Mendonça

Lugar/Cidade Mês Santo /santa
Juazeiro do Norte/CE Outubro/novembro Padre Cicero
Recife/PE Maio Frei Damião
Santa Cruz/RN Maio Santa Rita
Touros/RN Dezembro Bom Jesus dos Navegantes
João Câmara /RN Janeiro São Sebastião
João Câmara /RN Novembro/dezembro Festa da Padroeira de João Câmara
Fonte: Autores

Toré

O Toré é uma dança tradicional e cultural da comunidade que expressa nossos sentimentos e adorações aos ancestrais, em que glorificamos a mãe natureza e agradecemos por aquilo que temos e estamos conseguindo. Anteriormente, dançávamos em várias ocasiões, como por exemplo, nos momentos tristes, quando falecia alguém da comunidade. Atualmente, dançamos o Toré em momentos festivos, de lutas e reivindicações. Contudo, com o passar do tempo, essa prática foi se perdendo e hoje a dança Toré está em fase de revitalização com as crianças e jovens. As vestimentas usadas atualmente pelos participantes do Toré são feitos com algodão cru e ornamentadas com desenhos que fazem parte do cotidiano da comunidade, como o sol.

Nas comunidades, são produzidos brincos, colares, pulseiras, prendedores de cabelo, roupas de crochê, miniaturas de arcos e flechas e saiotes, estes, utilizados no ritual do Toré, não são comercializados. O ritual do Toré ocorre em momentos públicos ou fechados, a depender da ocasião, e representa, através das músicas e da dança, um importante instrumento de afirmação étnica. Os artesanatos utilizados no Toré são produzidos pelos próprios indígenas. O trecho de uma música tocada e dançada durante o ritual exprime essa importante relação: “Quero ver quem é que acaba, o resto da empeleitada” (Ferreira & Bezerra, 2018, p. 90).

A seguir, transcrevemos alguns cantos de toré:

(1) Fulozinha


Sou Fulozinha, fulo da mata,
Fulô, fulô, sou Fulozinha
Sou Fulozinha, fulô da mata,
Fulô, fulô, sou Fulozinha.
Estou pedindo, estou rogando,
alguém me dê uma fumacinha.
Estou pedindo, estou rogando,
alguém me dê uma fumacinha.

(2) Rei Areia


Eu estava na aldeia, mandaram me chamar (bis)
Caboclinhos da aldeia arreia, arreiá (bis)
Eu estava na aldeia, mandaram me chamar (bis)
E os caboclos da aldeia pisa firme na arreiá (bis)
Eu estava na aldeia, mandaram me chamar (bis)

(3) Quem Não Pode Com A Formiga


Pisa maneiro, pisa maneiro,
quem não pode com a formiga não assanha o formigueiro.
Pisa maneiro, pisa maneiro.
Mas quem não pode com a formiga não assanha formigueiro.
Pisa maneiro, pisa maneiro.

(3) Pássaro Azulão


Sou passo azulão, quando ele vem com as asinhas no chão.
Sou passo azulão.
Salve as caboclas de pena, peito de ema e suas flechas na mão.
Salve as caboclas de pena, peito de ema e suas flechas na mão.
Caboclinha da jurema, eu dancei no seu toré
para me livrar das flechas dos tapuias Canindé.

Rei Canindé, ou rei Canindé.
Uma palma de jurema para o rei Canindé.
Rei Canindé, ou rei Canindé.
Uma palma de jurema para o rei Canindé. Rei Canindé, ou rei Canindé.

O artesanato produzido pelos Mendonça

A comunidade do Amarelão produz o artesanato em cabaças, cipós, sementes (nativas e não-nativas) e penas na confecção de bijuterias (colares, pulseiras e brincos...), filtros dos sonhos, maracás, entre outros. A atividade é desenvolvida visando a preservação, a valorização e o reconhecimento da cultura indígena local. A comercialização destes produtos é feita por meio das feiras, exposições e encomendas. A comunidade tem um grupo de artesanato — o MOTYRUM CAAÇU: unidos pela arte — criado em 2007 com recursos financeiros do Prêmio Culturas Indígenas do Ministério da Cultura. O objetivo do grupo é fortalecer e valorizar o artesanato indígena do nosso estado. O grupo ministrou algumas oficinas de artesanato indígena em outras comunidades indígenas do estado do Rio Grande do Norte no ano de 2008. Além dos produtos produzidos pelo MOTYRUM, o Território Mendonça também trabalha com o crochê, colchas, vestimentas e tapetes de retalho, tricô e artesanato de madeiras (que simbolizam partes do corpo humano e são feitas para o pagamento de promessas) entalhados em umburana, planta nativa da comunidade.

Pontos de memória dos Mendonça

A comunidade possui um roteiro turístico, que é explorado de maneira simples, dependendo do interesse do visitante. Até o momento não conta com uma programação pré-definida.

A Pedra das Letras é uma formação rochosa que abriga um sítio de arte rupestre. Conhecida no Território Mendonça como “Pedras das Letras” ou “Pedra das Mãos de Sangue”.

Os Tanques de Pedra são um lajedo de porte médio onde em seu entorno corre um riacho, este que apenas serve de curso de água durante o período das chuvas. Ao chegar à parte superior do lajedo, tem-se uma fenda formada naturalmente na pedra, esta não tem uma grande expressividade, tendo aproximadamente 3,5 a 4 metros de comprimento e mais ou menos 1,2 metros de profundidade. Além disso, existe uma construção de tijolos de cerâmica e pedra unidas com cimento em uma de suas margens, para aumentar o volume de água e agregar ao seu aproveitamento como ponto de lazer e turismo aos domingos.

A Pedra do Sino é uma rocha pequena de aproximadamente 2,5 metros de comprimento e mais ou menos 1 metro de altura, sendo aparentemente uma rocha comum entre as demais, no entanto, esta rocha emite um som semelhante ao de um sino de igreja. Por tal particularidade, os membros da Igreja Católica do Território Mendonça enxergaram essa rocha como sendo um local de sinais favoráveis ao culto e foi providenciada e implantada uma cruz no alto do lajedo próximo à Pedra do Sino.

A Pedra do Sino também é um espaço que integra a história da comunidade. Durante a primeira retomada territorial feita pelos Mendonça, na década de 1990, esse foi o local do primeiro acampamento, onde sofreram muitas represálias, tiveram barracos queimados e muita gente ameaçada.

O quarto e último ponto de memória localiza-se na comunidade Amarelão. Trata-se de uma Gameleira. Segundo a tradição oral do grupo familiar Mendonça, a árvore foi o primeiro local de encontro coletivo para a compra e troca de produtos e gêneros alimentícios provenientes da caça, da coleta/extrativismo e da produção agrícola.

Além desses lugares descritos acima, temos outros não tão famosos, mas que também são considerados pontos de memória dos Mendonça, sendo eles: o Açude do Amarelão, a Linha Férrea (marco divisor das comunidades do Amarelão e o Assentamento Santa Terezinha) e a Cacimba Salgada (marco divisor entre o Amarelão e Serrote de São Bento).

Autores/as:

Dioclécio Bezerra da Costa

Indígena da etnia Potiguara – Mendonça (aldeia Assentamento Santa Terezinha, município de João Câmara) e mestrando em Antropologia Social (PPGAS) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).

Tayse Michelle Campos da Silva

Indígena da etnia Potiguara – Mendonça (aldeia Amarelão, município de João Câmara) e mestra em Antropologia Social (PPGAS) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).

Notas de Rodapé

¹ Fala de Manoel Batista, em entrevista realizada em 2017 pelos professores indígenas do Serrote de São Bento para construção do E-book “AVÁ ARANDÚ: nossas raízes e histórias”.

² Fala de Rosa Batista da Costa, em entrevista realizada em maio de 2017 no Serrote de São Bento pelos professores indígenas do Serrote de São Bento para construção do E-book “AVÁ ARANDÚ: nossas raízes e histórias”.

³ Fala de Dona Dadinha, em entrevista realizada no Assentamento Santa Terezinha, em maio de 2017, pelos professores indígenas do Assentamento Santa Terezinha para construção do E-book “AVÁ ARANDÚ: nossas raízes e histórias”.

⁴ Produção textual da aluna Mirela Ferreira, do 5º ano, da Escola M. Alice Soares, em 2016.

Referências

ALMEIDA, Daniela Soares de. Reforma agrária no assentamento Marajó/RN (1989 a 2001). UFRN-Natal/RN-2002.

COSTA, Dioclécio Bezerra da. Educação escolar indígena: Recorte a partir da história local da comunidade indígena do Assentamento Santa Terezinha. João Câmara: IESM, 2016.

COSTA, Dioclécio Bezerra da. A importância do psicopedagogo na educação escolar indígena. FMB-João Câmara, 2018. E-book AVÁ ARANDÚ: nossas raízes e histórias. Ação Saberes Indígenas na Escola, realizado pelo Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN/Campus Canguaretama/RN), no período de dez meses (2017).

FERREIRA, Flávio Rodrigo Freire. BEZERRA, Nilton Xavier. Vamos ver quem é que acaba, o resto da empeleitada: arte indígena entre os potiguaras da aldeia Catu dos Eleotérios e Sagi/Trabanda. Revista Mundaú, Alagoas, n.4, 2018, p.80-103.

GUERRA, Jussara Galhardo Aguirres. Identidade indígena no Rio Grande do Norte: caminhos e descaminhos dos Mendonça do Amarelão. 1 ed. Fortaleza: Editora IMEPH, 2011.

JÚNIOR, Gerson Alves da Silva. Psicologia, Ciência e Profissão, Educação Inclusiva e Diferenciada Indigena. Instituto de Psicologia da Universidade Federal de Alagoas, 2000. p. 40-49. Disponível em: https://www.scielo.br/j/pcp/a/cCfYzysd4nBFQsTGgr65GSv/?lang=pt. Acesso em: 20 de mar. de 2022.

ORGANIZAÇÃO, Internacional do Trabalho. Convenção n° 169 sobre povos indígenas e tribais e resolução referente à ação da OIT/organização internacional do trabalho-Brasília: OIT, 2011.

SILVA, Tayse Michelle Campos da. Como as mulheres indígenas do Amarelão se organizavam nas décadas de 1970 a 1990. João Câmara: UERN, 2018.

Como referenciar

COSTA, Dioclécio Bezerra da; SILVA, Tayse Michelle Campos da. Potiguara - Mendonça. Povos Indígenas do Rio Grande do Norte. 2020. Disponível em: http://www.cchla.ufrn.br/povosindigenasdorn. Acesso em:

Costa, Dioclécio Bezerra da; Silva, Tayse Michelle Campos da. “Potiguara - Mendonça”. Povos Indígenas do Rio Grande do Norte [online]. []. http://www.cchla.ufrn.br/povosindigenasdorn

Costa, Dioclécio Bezerra da; Silva, Tayse Michelle Campos da. (2020). “Potiguara - Mendonça”. Povos Indígenas do Rio Grande do Norte. [online]. . http://www.cchla.ufrn.br/povosindigenasdorn

Costa, Dioclécio Bezerra da; Silva, Tayse Michelle Campos da. 2020. “Potiguara - Mendonça”. Povos Indígenas do Rio Grande do Norte. . http://www.cchla.ufrn.br/povosindigenasdorn

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